terça-feira, 31 de dezembro de 2013

A Luiz Vilela, no dia do seu aniversário

HOMENAGEM AO AMIGO LUIZ VILELA

Lidiane Ribeiro
Escritora, Ficcionista[i]

Dia 31 de dezembro é um dia especial, pois é o dia em que se comemora o nascimento de um mestre da literatura: Luiz Vilela. Desde a infância, esteve rodeado de livros, pois era caçula e na sua família todos liam e tinham sua biblioteca particular. Aos 13 anos, começou a escrever. Depois, formou-se em Filosofia, em Belo Horizonte. Aos 24 anos estreou com os contos de Tremor de Terra, livro que ganhou, em Brasília, em 1967, o Prêmio Nacional de Ficção. Foi jornalista em São Paulo e viveu nos Estados Unidos e na Espanha. Também recebeu o Prêmio Jabuti, em 1974, pela coletânea de contos O Fim de Tudo (1973). E em 2012, pelo romance Perdição (2011), recebeu o Prêmio Literário Nacional PEN Clube do Brasil. Narrativas suas já foram adaptadas para o teatro, o cinema e a televisão, e traduzidos para diversas línguas.
Por seus quinze livros já lançados, pelos outros já anunciados, pelos prêmios recebidos, pela qualidade de sua obra, pela disponibilidade com que ensina a quem, como eu, está começando, eu o chamo de mestre e comemoro esse 31 de dezembro, data do aniversário de nascimento de Luiz Vilela. Hoje é dia, pois, de brindar e festejar sua saúde, comemorar com alegria e agradecer sua amizade e suas obras.
Faço meu agradecimento falando um pouco de algumas coisas que ele me ensinou e um pouco de seus livros. É meu jeito de agradecer ao amigo a quem chamo, simplesmente, e carinhosamente, de Vilela.
Assim que o conheci e falei a ele da minha vontade de me tornar escritora, ele me falou: “leia muito, quanto mais você ler, mais vai aprimorar seus conhecimentos”. Segui o conselho, começando, claro, pelos livros dele, todos disponíveis na Biblioteca Municipal de Ituiutaba. Fiquei fascinada com o conteúdo dos livros, as personagens, os narradores, o enredo — todas as suas narrativas, contos, novelas e romances, me envolviam, me entusiasmavam, me encantavam.
Tendo lido esses livros, foi lançado aqui em Ituiutaba, agora em dezembro de 2013, o livro de contos Você Verá. Foi no dia 13 de dezembro, uma sexta-feira, noite inesquecível, com centenas de amigos e de admiradores, com sessão de autógrafos que seguiu por horas. Participei passo a passo desse momento e posso testemunhar: foi uma noite de muitas e fortes emoções, para mim, que acompanhava, e também para o Luiz Vilela.
Você verá é um livro que prende o leitor a cada novo conto. É de leitura fácil, de palavras transparentes, que ao mesmo tempo em que não deixam dúvidas quanto ao que significam, aprofundam sentidos e sentimentos. Cada leitor interpreta as narrativas de Vilela a seu modo, e retorna e volta a ler e a reler cada um de seus contos, novelas ou romances sem se cansar. Ao apresentar minha leitura, quero que minhas palavras sejam de convite para que cada um que me leia se sinta interessado em também descobrir os sortilégios da obra do Luiz Vilela.
O primeiro conto do Você Verá é o “Zoiuda”: “Foi numa noite que ele conheceu Zoiuda. Foi numa noite”. E Zoiuda se torna presença constante, até que um dia se vai e deixa saudade...
“Era aqui” é o segundo conto. Um casal, uma praça, em uma cidade pequena, do interior. Lembranças. Imagens do tempo de criança. O passado se presentifica.
O terceiro conto tem por título “O que cada um disse”. Retrata diferentes opiniões sobre uma personagem — e sua tragédia — que surge no conto apenas pela fala de terceiros: conhecidos distantes ou próximos, freiras, amigos, colegas da faculdade ou do trabalho, um especialista em psicologia em entrevista ao jornal.
O quarto conto, “Céu estrelado”, mostra a noite de ano novo, com suas expectativas transformadas em obrigação — e aí, cumprir ou não cumprir tais obrigações?
E “Todos os anjos”, quinto conto da coletânea, o diálogo entre um pai e o filho mostra a curiosidade infantil e a capacidade inventiva do adulto.
Um dos contos mais tocantes do volume é “O bem”, o sexto e mais longo conto do livro, exatamente na metade da coletânea. Mostra dificuldade na rotina diária, na qual um momento simples se torna importante com o passar dos dias.
“Quando fiz sete anos” é o sétimo conto. Um criança ganha do avô um presente quebrado. E mais não digo, para não estragar as surpresas do leitor com a narrativa.
O oitavo conto é “Corpos”, no qual imagens e cenas tristes, trágicas, povoam o diálogo de pessoas insensíveis aos acontecimentos que comentam.
“Noite feliz”, é o nono conto. Imaginação? Solidão? Sentimentos confusos, misturados? Em uma noite de Natal, uma jovem aguarda o planejado e esperado encontro familiar.
O décimo conto é “Mataram o rapaz do posto”. A notícia de um assassinato indicia o fim de um bairro tranquilo, de uma rua pacata... será que ainda há rua pacata em bairro tranquilo no Brasil?
O conto “Você verá”, o décimo primeiro da coletânea, encerra o volume, com os sonhos de todos nós de um país que realize os sonhos de prosperidade sonhados quando da construção de Brasília.
Com esse percurso encerro essa homenagem a Luiz Vilela, o mestre e o amigo, parabenizando-o por fazer parte da vida de tantas pessoas, como escritor, como personalidade ituiutabana, como alguém que se doa para todos, na obra e na vida, na ficção e na realidade, aos familiares e aos amigos, e até aos somente conhecidos, sejam jovens, sejam experientes.
Para contar sua história, Luiz Vilela, uma biografia de quinhentas páginas seria pouco. Minha homenagem singela, passe o lugar-comum, pois que a vida é feita de lugares-comuns, não é mesmo?, representa algumas linhas dessa biografia aqui imaginada, aqui sugerida. Agradeço-o por ser o exemplo que é, por ser amigo e ser professor, ser companheiro nas letras e pelas letras, a cada amanhecer, me ensinar algo. Parabéns pelo novo livro, o fascinante Você verá, e pelos outros, que virão. Parabéns pelo aniversário. Continue escrevendo e nos engrandecendo com suas obras e com seu jeito simples, humilde, que muito nos ensina.

Lidiane, no lançamento do Você Verá em Ituiutaba, MG, no dia 13 de dezembro de 2013


[i] Lidiane Ribeiro nasceu em 1981 em Ituiutaba, MG. Passou a infância na região rural onde nasceu. Publicou até o momento seis livros: uma biografia, dois de genealogia, com depoimentos de diversos familiares, e três de ficção. Contatos: https://www.facebook.com/people/Lidiane-Ribeiro-Borges/100004451824828.

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

A noite de Natal na obra de Luiz Vilela

        A noite de Natal é o espaço e o tempo de dois contos de Luiz Vilela: “Feliz Natal” e "Noite Feliz".

        Em "Feliz Natal", a personagem faz de tudo para sozinha comemorar o Natal. Conseguindo seu intento, faz solitário brinde em seu apartamento.

        Em “Noite feliz”, há uma síntese da visão do autor sobre a religião, o catolicismo e a civilização ocidental; o conto é sátira na tragédia encenada por personagem com o significativo nome de Aristotelina.

        Para  Rauer,  na  tese  Faces do conto de Luiz Vilela, "os contos, novelas e romances de Luiz Vilela, que tratam do religioso, recriam um universo cujo significado estético é o de propugnar um humanismo visceral em que o homem tem valor por sua própria existência, não justificando sua ética pela transcendência religiosa".

        Para ter acesso à tese de Rauer, vá à aba "Fortuna Crítica" ou clique aqui. Para ouvir o conto "Noite Feliz", clique aqui. O conto está no livro Você Verá (2013); já o conto "Feliz Natal" está no livro Lindas Pernas (1979). E para mais comentários sobre o conto "Noite Feliz", clique aqui e aqui.

domingo, 22 de dezembro de 2013

Livro de Luiz Vilela está no Vestibular da Universidade Estadual de Ponta Grossa, no Paraná

                                                                                                            Domingo, 22 Dezembro 2013 16:56
UEPG anuncia mudanças para 2014 no processo seletivo para estudantes

Por   | Para: CBN Foz
Campus central da UEPG, em Ponta Grossa, durante o Vestibular de Inverno 2013 (Foto: Divulgação/UEPG)UEPG anuncia novas regras para Processo Seletivo
Seriado e vestibulares (Foto: Divulgação/UEPG)
A Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), na região dos Campos Gerais do Paraná, anunciou, nesta sexta-feira (20), mudanças nas regras do Processo Seletivo Seriado (PSS), aplicado a estudantes do Ensino Médio, a partir de 2014. Entre as alterações estão a inclusão de disciplinas, como Filosofia e Sociologia, novos gêneros de texto para a prova de redação e a leitura de novas obras literárias.
As mudanças foram definidas por representantes das redes pública e privada de ensino e aprovadas pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE). Segundo a universidade, o objetivo é atender às Diretrizes Curriculares do Paraná e também, atualizar o conteúdo programático do Ensino Médio. As disciplinas de Sociologia e Filosofia são obrigatórias no currículo da rede pública desde 2008.
O PSS é um processo que possui duração de três anos. Conforme a UEPG, as novas regras passam a valer para os candidatos que realizam a primeira prova do processo seletivo, no triênio 2014-2016. Já os estudantes dos triênios 2012-2014 e 2013-2015, que estão no meio da avaliação do processo seletivo, permanecem com o conteúdo programático, mas terão de realizar a redação com novos gêneros e fazer a leitura de novas obras literárias.
Redação e literatura
Para as provas da primeira turma do PSS, a redação passa a contar com gêneros como comentários, blogs, crônicas jornalísticas, narração escolar e relato autobiográfico. Quanto à literatura, serão cobradas as leituras de “Melhores Poemas”, de Cláudio Manoel da Costa, e “Cartas Chilenas”, de Tomáz Antônio Gonzaga.
Para as turmas do PSS II, a UEPG vai cobrar as obras “Noite na Taverna”, de Alvarez Azevedo, e “O Alienista”, de Machado de Assis. O candidato terá de elaborar a redação atendendo aos gêneros de carta do leitor, notícia, texto de opinião dissertativo-argumentativo e resumo.
Os estudantes que farão a última etapa do processo seletivo deverão ler as obras “Recordações do Escrivão Isaías Caminha”, de Lima Barreto, “O Aprendiz de Feiticeiro”, de Mário Quintana, “O Grande Mentecapto”, de Fernando Sabino, “Quase Memória, Quase Romance”, de Carlos Heitor Cony, e Amor e Outros Contos”, de Luiz Vilela. A redação vai ser aplicada com os gêneros de carta de reclamação, carta resposta à reclamação, texto de opinião dissertativo-argumentativo, notícia e resumo.
Como funciona o PSS
Segundo a universidade, a UEPG foi a primeira instituição paranaense a implantar o PSS, no ano 2000. Diferente de um concurso tradicional, que realiza provas com todo o conteúdo escolar de uma vez só, nesse sistema, o aluno é avaliado ao final de cada série do Ensino Médio. Nos dois primeiros anos, o estudante realiza as provas sem definir por qual curso deseja disputar uma vaga.
Somente ao final do terceiro teste, o candidato pode optar por um dos 38 cursos ofertados pela UEPG, em Ponta Grossa, Castro ou Telêmaco Borba. A partir da soma dos resultados dos três concursos, o aluno tem a chance de conquistar uma vaga. De acordo com a instituição, todos os anos, 25% das vagas dos cursos de graduação são reservadas para quem realiza este processo seletivo.
Vestibular também muda
A UEPG também informa que, a partir de 2014, os vestibulares da universidade também serão alterados nas questões de literatura. As mesmas obras cobradas na última etapa do PSS serão exigidas no concurso. Além disso, a redação também vai utilizar dos mesmos gêneros textuais do PSS III.

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

UFMS DE TRÊS LAGOAS CONQUISTA O DOUTORADO EM LETRAS

A CAPES divulgou na quarta-feira, 18 de dezembro de 2013, a aprovação do pedido de Doutorado feito pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da UFMS do Câmpus de Três Lagoas, que oferece o Curso de Mestrado em Letras (Áreas de Concentração em Estudos Linguísticos e em Estudos Literários). A CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) é o órgão do governo federal que traça as diretrizes para a pós-graduação brasileira. Confira o resultado do pedido em 
O PPG-Letras destacou-se nos últimos quatros anos, tanto no âmbito da UFMS quanto no concerto nacional da área de Letras & Linguística, ao reformular procedimentos, adequar o quadro docente, implantar filosofia de seguir ao pé da letra os princípios acadêmicos determinados pela CAPES e implantar administração transparente e com decisões colegiadas. Eis algumas das conquistas do Programa nos últimos quatro anos:
1. Implantou um Doutorado Interinstitucional com a Universidade Presbiteriana Mackenzie (Dinter UFMS/UPM), obtendo recursos da ordem de seiscentos mil reais para capacitar professores da UFMS e de outros órgãos federais de Mato Grosso do Sul.
2. Implantou o Curso de Mestrado Profissional em Letras, participando da primeira turma do PROFLETRAS em rede nacional, preenchendo todas as vagas oferecidas e com bolsa de mestrado para todos os acadêmicos.
3. Realizou em Três Lagoas diversos encontros regionais com pesquisadores da região do Centro-Oeste, como o II Fórum de Coordenadores de Pós-Graduação em Letras do Centro-Oeste e o IV Simpósio da Rede Centro-Oeste de Pesquisa e Ensino em Arte, Cultura e Tecnologias Contemporâneas (Rede CO3), eventos financiados pela CAPES.
4. Realizou em Três Lagoas eventos de cunho internacional, seja com palestras de convidados de universidades do exterior, como, entre outros, a Profa. Vera Lúcia de Oliveira Maccherani (Facoltà di Lettere e Filosofia, Università degli Studi di Perugia), Brita Morisse Pimentel (tradutora da poesia de Manoel de Barros na Alemanha), Profa. María Eugenia Flores Trevino e Prof. Jose Javier Villareal (Universidad Autonoma de Nuevo Leon – UANL, México), Prof. John Lachan Mackenzie (Vrije Universiteit/ILTEC) e Prof. Carlos da Costa Assunção (Universidade Trás-os-Montes e Alto Douro/UTAD), seja com encontros como o I Simpósio Internacional de Linguística Funcional (SILF).
5. Conquistou o estrato superior de periódicos para a revista Guavira Letras, que subiu para o conceito B2.
6. Conquistou nota 4 para o Curso de Mestrado, em avaliação divulgada pela CAPES no início deste mês.
Para a professora Kelcilene Grácia-Rodrigues, que foi Coordenadora do PPG-Letras de 2010 a 2013, nenhuma dessas realizações e conquistas, entre muitas outras, teria sido possível sem o trabalho de equipe que foi desenvolvido, com o apoio da direção do Câmpus, da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação e da Reitoria:
“Ao nos direcionarmos todos, professores do programa, integrantes do colegiado e administração da universidade, para o objetivo do crescimento do PPG-Letras, conquistamos juntos as metas que juntos estabelecemos. Para o pedido do Doutorado, constituímos Comissão, presidida pelo Professor Rauer Ribeiro Rodrigues e integrada pelos professores José Batista de Sales, Edson Rosa e por mim, e trabalhamos de modo incansável para atender a todos os muitos, minuciosos e exigentes tópicos da proposta, conforme exige a CAPES.”
Para o Professor Rauer Ribeiro Rodrigues, coordenador do GPLV - Grupo de Pesquisa Luiz Vilela e presidente da Comissão que elaborou o projeto do doutorado e sua solicitação junto à CAPES, além do trabalho em equipe, a Comissão que elaborou a Proposta de Doutorado do PPG-Letras da UFFMS de Três Lagoas soube conciliar o sonho de muitas gerações de professores de Letras da UFMS com o momento atual da instituição e da pós-graduação no Brasil. Para Rauer, no entanto, a euforia da conquista, “que é justa”, ele ressalta, “não vai nos ofuscar para o muito trabalho e árduo caminho que ainda temos de trilhar não só para consolidar a pós-graduação na área de Letras na UFMS, mas para torná-la uma referência nacional pelas pesquisas que realiza, pelas muitas publicações em periódicos qualificados por parte de seus docentes e, em especial, pela qualidade dos profissionais que forma”.

"Por fim", concluiu o professor Rauer, "é preciso enviar um agradecimento a todos os professores que já atuaram no PPG-Letras, assim como nossos colegas no atual momento, a Direção do Câmpus, a Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação e a Reitoria. A participação de todos foi imprescindível para que conquistássemos o Doutorado."

domingo, 15 de dezembro de 2013

Você Verá - 4

Inquietação e prazer »

Luiz Vilela reúne 11 contos no livro 'Você verá'

Novo trabalho do autor sugere contraponto entre natureza e cultura com a presença de animais nas histórias

Publicação:07/12/2013 00:13Atualização:09/12/2013 14:29


 “Andava pelo quinteiro, muito asno, muito parvo, como se mesmo a dois passos não estivesse a acontecer aquela grande desgraça. É certo que também ele, Nero, vira morrer o gato, um sem-número de frangos e galinhas, e cada ano seu porco, sem o menor estremecimento. A verdade, acima de tudo. Mas desta vez, o caso mudara de figura: finava-se um cão...”
Miguel Torga, “Nero”, Bichos

Para tratar da recente coletânea de contos de Luiz Vilela, 'Você verá', lanço mão de um texto do português Miguel Torga, autor de um belo e estranho volume de contos intitulado Bichos, publicado em 1940.

 Sabe-se que o escritor mineiro, com certa obsessão, sempre valorizou os animais irracionais em sua obra, muitas vezes até relativizando a noção de racionalidade no confronto entre bicho e homem. E, ao pôr em cena um cão, um gato, uma lagartixa, um pássaro, um gambá, um tatu, o que se vê, em verdade, é o drama humano, é a situação limite que ronda todos os seres perecíveis. Se Miguel Torga centrava toda a ação narrativa em personagens-bichos com nomes humanos, Luiz Vilela nem sempre situa o bicho como protagonista, mas frequentemente como discreto coadjuvante, e, com isso, sutilmente estabelece um contraponto entre natureza e cultura, premiando o leitor com alta voltagem de inquietação e também de prazer.

São 11 os contos de Você verá e, a rigor, apenas o primeiro, “Zoiuda”, apresenta uma lagartixa como personagem marcante, cuja participação é a de fazer companhia a um solitário e desiludido professor de português. A aparição e sumiço desse animalzinho pontuam uma vida de tédio do protagonista, mas que chega a pressentir um “minúsculo coração” que poderia estar “batendo um pouquinho mais forte” (p.7). Não seria a literatura exatamente uma das artes que provocam esse tipo de emoção?

No conto “Era aqui”, o homem mostra à namorada o lugar onde outrora havia o campinho de futebol de sua infância. Em meio à crítica sobre as promessas mentirosas dos políticos (prefeitos que iriam fazer a praça), o que impera é o poder da nostalgia, mediada por um sabiá que, “escondido na folhagem de uma árvore, emitia, a intervalos, o seu canto, sempre igual e sempre belo” (p.14). E é ouvindo o canto dessa ave que o homem, mergulhado em suas recordações, dali emerge e faz uma declaração de amor à companheira.

Em “O que cada um disse” temos uma narrativa polifônica, em vários blocos, criando uma dramática expectativa sobre o que teria feito um certo sujeito. Num determinado ponto, aparecem os bichos como eloquentes metáforas dos mistérios entranhados nas criaturas racionais: “O ser humano é como uma floresta: você olha de fora, e a floresta é aquela maravilha; mas você entra, e lá dentro você dá com onças, cobras, escorpiões” (p.21). Nessa mesma narrativa há o comportamento irracional de um Tidião que pegara uma espingarda e deu tiro em tudo que era bicho: “Vaca, porco, o cavalo, o cachorro. Nem o gato escapou. Nem o galo. Ele deu tiro até em passarinho na árvore”(p.24).

Uma das melhores histórias do livro é “Céu estrelado”: o homem regressa de carro para sua cidade, numa noite de passagem de ano, e cruza na estrada com um tatu, e o trata respeitosamente em seus pensamentos. (Em Tremor de terra, um dos personagens acaba se transformando em tatu.) Essa cordialidade com o bicho contrasta com o ambiente de sua casa, repleta de gente e dominada por uma mulher estúpida com quem ele conversa pelo celular. O desfecho desse conto, com direito ao aroma dos eucaliptos, é digno das grandes narrativas de Luiz Vilela sobre as angústias do bicho homem.

Em “Todos os anjos”, o mais lúdico dos textos, o pai conversa com seu filho que vem de uma aula de catecismo. A história gira sobre a existência dos anjos, que se assemelham a pássaros e a cobras voadoras. E a certa altura do diálogo o pai fala que “a minhoca só falava na língua delas: o minhoquês” (p.42). Como o menino estava com a cabeça cheia das informações da freira que lhe dava aulas, é irresistível a associação entre esse anelídeo e as ideias que botavam na cabeça das crianças...

Crueldade 
No mais longo dos contos, “Bem”, em que o narrador ocupa dois planos da narração (o momento da enunciação e o tempo em que fizera amizade com um limpador de privadas, o “Bem” do título), temos uma espécie de ensaio sobre a crueldade humana: o narrador acaba tendo prazer de ouvir pelo telefone todas as desgraças que abatem sobre o pobre diabo que só atraía males, pois afinal os males vêm para o bem. Muitos trocadilhos perpassam pela narrativa em que o autor explora mais uma vez a catarse através da conversa telefônica, como já fizera em “Tarde da noite”. Num determinado momento, o gato que quebra o vaso da esposa de Bem e o cachorro que adoece e morre marcam e prenunciam mais desgraças que cercam o personagem.

O passado retorna no conto “Quando fiz sete anos”, em que o narrador recorda-se da bússola estragada que ganhara do avô. Num instante de intensa alegria, surge o bicho expresso em metáfora: “Eu agradeci e, doido para abrir o embrulho, fui para casa, a três quarteirões dali, voando como um alegre pássaro da manhã” (p.80).

Na mais mórbida das narrativas, “Corpos”, o autor expõe traços negativos da curiosidade humana: duas pessoas vasculham um site procurando detalhes dos corpos estraçalhados num desastre aéreo. Os bichos aparecem em dois planos: num dito popular: “abra um corpo e verás teu corpo, dizia minha avó” (p.85); e nos bichos da floresta em que o avião caíra: um passarinho que estava “todo tranquilo” (p.87) num galho, indiferente à tragédia, e nos supostos bichos que poderiam ter arrastado corpos das vítimas (p.89).

O caráter trágico e irônico retorna em “Noite feliz”, um dos contos mais pungentes, sobre uma mulher solitária numa noite de Natal. O autor é extremamente econômico em suas informações, deixando ao leitor a construção mais completa do quadro que se verá. Mas um gato aparece nas lembranças da protagonista, o macio e quentinho felino que se chamava Pretinho, nome que, metonimicamente, remete ao desfecho inesperado.

Em “Mataram o rapaz do posto” há o mal-entendido sobre a morte do homem citado no título. O bicho que aparece na história é um gambá. Mas o grande fedor está implícito (novamente) na crueldade humana.

No conto “Você verá”, que fecha o livro, você, leitor, não verá bicho algum. O protagonista encontra-se, de madrugada, num bar da rodoviária de Brasília, nos primeiros tempos da nova capital. O dono do barzinho é esperançoso em relação à cidade construída pelo “maior dos mineiros” (p.109). Crê o homem que este é “um país onde todos terão oportunidade, onde ninguém mais passará fome, ninguém mais precisará pedir esmola nas ruas” (p.108). O narrador se encontrava empoleirado num banquinho (p.105). Empoleirado, como uma ave, talvez como um bem-te-vi. E é a sensação que temos ao fechar o livro, bem-te-vi, com todos bens e males do bicho humano neste mundo tão pequeno...

Caio Junqueira Maciel é escritor.

Você verá
Luiz Vilela
Editora Record
128 páginas, R$ 30


Romancista e contista, Luiz Vilela mira nos eventos banais para mergulhar no sentido da existência - http://beneviani.blogspot.com.br/2013/12/inquietacao-e-prazer-caio-junqueira.html >. 

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Uma entrevista com Luiz Vilela


Você Verá


       Depois de publicar, em 2011, o romance Perdição, você, com o Você Verá, volta ao conto...
      Não, na realidade eu não voltei, porque os contos de Você Verá foram escritos nos últimos dez anos, o mesmo período em que escrevi o Perdição e a novela Bóris e Dóris, publicada em 2006.

      Ao longo de seu percurso literário você sempre transitou entre o conto, a novela e o romance. Como que é isso?
     É simples: eu sou um contador de histórias, e romance, novela e conto são para mim apenas diferentes formas de contá-las.

      Você viveu nos Estados Unidos, depois na Espanha, passou temporadas em Cuba, na Alemanha e no México, mas sempre retornou a Ituiutaba, sua cidade natal, no interior de Minas. É nela que você encontra o maior impulso para escrever?
     O maior impulso para escrever me vem de tudo o que eu vivi nos lugares onde morei ou por onde passei e que ficou registrado na minha memória.

     Quais foram as suas principais referências literárias nos seus inícios como escritor?
     Tendo começado a ler muito cedo e a escrever ficção aos 13 anos, aos 20 eu já tinha lido quase tudo o que mais importava ler na literatura nacional e na estrangeira, e embora eu pudesse destacar aqui alguns autores, prefiro dizer que, de um modo ou outro, todos esses livros me influenciaram.

     Você Verá parece habitado especialmente por personagens mineiros...
      Como sou mineiro e como passei a maior parte de minha vida em meu estado, é natural que alguns de meus personagens tenham traços mineiros, mas não é isso o que mais interessa neles, e sim o que eles têm em comum com pessoas de outros estados e até de outros países. Acho que qualquer pessoa de qualquer parte do mundo que ler os meus contos irá se identificar com os meus personagens.

      Há em vários contos a presença de animais. Qual é a sua relação com eles?
      Eu gosto muito de bichos. Sempre gostei, desde criança, e sempre os tive. Ainda recentemente, eu tinha em casa três gatos: um rajado, um preto e um siamês, branco e bege, da cabecinha preta e olhos azuis. Os dois primeiros morreram de doença, e o terceiro, que era o meu companheiro inseparável, uma noite saiu e, sem que eu saiba o que aconteceu com ele, não voltou mais, me deixando na maior tristeza.

      Alguns contos são marcados por momentos de humor...
      O humor, para mim, é fundamental, não só na literatura, mas também na vida, declaração que já fiz dezenas de vezes e que aqui volto mais uma vez a fazer.

      Outros contos são marcados pelo desencanto...
      Um dos personagens de um dos contos, uma velha senhora, diz: “Do ser humano tudo se pode esperar: das melhores às piores coisas.” Infelizmente são as piores as que mais temos visto. Alguém discordará de mim?...

      Você se dedica inteiramente à literatura. Como é a rotina de um dos escritores mais importantes do Brasil?
      A maior parte do tempo eu passo em casa, escrevendo, resolvendo questões ligadas à minha atividade, lendo os jornais do dia. No restante do tempo eu cuido de minhas necessidades pessoais, quando então geralmente saio à rua e encontro amigos e conhecidos, com quem sempre bato um papo e às vezes tomo um cafezinho ou uma cerveja. É essa, em resumo, a minha rotina.

Luiz Vilela e "Lindo", um de seus gatos

Entrevista de divulgação
Editora Record
Novembro de 2013

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Você Verá - 3


Luiz Vilela lança livro na base da simplicidade
Por Elemara Duarte
HOJE EM DIA, Belo Horizonte, 26 nov. 2013.

domingo, 1 de dezembro de 2013

1º Seminário do GPLV debateu projetos sobre a obra de Luiz Vilela

Luciene, Eunice, Rauer, Pauliane e Karina, em registro após o 1º Seminário do GPLV, em 30 de novembro de 2013

Aconteceu neste sábado, dia 30 de novembro, nas dependências do PPG-Letras da UFMS, no Câmpus de Três Lagoas, o 1º Seminário do Grupo de Pesquisa Luiz Vilela. Na ocasião, foram debatidas as súmulas de três anteprojetos: um de mestrado, um de doutorado e um de pósdoutorado. Os arguidores foram os professores MSc. Luciene Lemos de Campos, e Drs. Kelcilene Grácia-Rodrigues e José Batista de Sales.

O primeiro debate foi da proposta da mestranda do PROFLETRAS Karina Torres Machado, "Alternativas metodológicas: uma análise de práticas de ensino por meio da obra de Luiz Vilela", arguido por Luciene e Sales, no primeiro momento, e na sequência por Kelcilene e outras pessoas presentes na plateia.

Em seguida, os professores Kelcilene e Sales debateram a súmula do anteprojeto "Uma biografia literária de Luiz Vilela", em elaboração pela MSc. Pauliane Amaral, com intervenções posteriores da plateia e da profa. Luciene.

Por fim, foi debatido o anteprojeto da Dra. Eunice Prudenciano de Souza, "A metacrítica da fortuna crítica de Luiz Vilela", com arguições dos profs. Sales e Kelcilene,  e indagações pela profa. Luciene e pela mestranda Anna Fioravante, integrande do GPLV, e também com participação de outros dos acadêmicos presentes.

Para o prof. Rauer, líder do Grupo de Pesquisa Luiz Vilela, este 1º Seminário do GPLV foi muito produtivo, com debates substanciosos e de muita valia não só para os projetos avaliados, mas também para os projetos dos demais pósgraduandos que estiveram no evento: "O modelo de Seminário de projetos, a exemplo de outros encontros em que debatemos estudos em andamento ou concluídos, nos têm permitido ampliar e verticalizar as atividades do GPLV", afirmou o professor.

O Grupo de Pesquisa Luiz Vilela finaliza esta nota agradecendo aos acadêmicos que participaram do encontro, aos pesquisadores do GPLV que colocaram seus anteprojetos em debate e, em especial, aos debatedores, profs. Sales, Luciene e Kelcilene, que qualificaram a discussão com sua experiência, discernindo caminhos seguros para que os projetos se viabilizem e antecipando problemas e questões que podem dificultar a trajetória ou mesmo inviabilizar as pesquisas projetadas.