Em entrevista concedida em 2003, Luiz Vilela falou da publicação de Tremor de terra, que marcou sua estreia, e de como, devido a isso, as portas das editoras, que até então recusavam os originais de No bar, que seria o seu primeiro livro, se abriram. Abaixo, a íntegra da reportagem - que foi publicada originalmente na Folha de S.Paulo.
30/08/2003 - 06h17 - http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u36299.shtml
Estréia resgata produção de Luiz Vilela
MARCELO PEN
crítico da Folha
O livro de contos "Tremor de Terra" pode servir de inspiração aos novos talentos. Em 1967, a obra ganhou, em Brasília, o Prêmio Nacional de Ficção. Tratava-se de uma edição modesta, custeada pelo autor, o mineiro Luiz Vilela, então com 24 anos. Bateu outros 250 escritores, inclusive medalhões como Mário Palmério, Osman Lins e José Geraldo Vieira. Dizem que este último estava tão certo da vitória que adentrou a capital federal com o discurso de agradecimento pronto.
Vilela, 61, conta que o livro nem era para ser seu primeiro. "Escrevia contos desde os 13 anos; só com os que rasguei poderia ter composto outros três livros", avalia. O autor reuniu os que julgou serem os melhores numa obra chamada "No Bar", mas não encontrou nenhuma editora. "Em desespero de causa", decidiu costurar um segundo volume com os contos restantes e publicá-lo por conta própria. Era "Tremor de Terra". Depois da premiação, "as portas das editoras abriram-se".
Passados mais de 20 anos desde a última edição, em 1980, Vilela aproveitou para fazer o texto passar por um escrutínio completo. Garante não ter feito alterações substanciais. "Depois de ter o livro publicado, não mexo mais em elementos fundamentais como história e personagem; nesse aspecto, está pronto." Confessa ter efetuado pequenas operações de linguagem, como "a troca por uma palavra melhor, a busca da eufonia, a correção de erros".
O livro foi indicado para o vestibular 2004 da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o que talvez responda em parte pelo sucesso da presente edição.
Segundo Vilela, a comissão da universidade decidiu pela inclusão da obra por considerá-la "um clássico". Mas será que a consagração não pode ser temerária também, no que ela insinua de caráter modelar, de encerramento de uma trajetória? Embora revele ser "o único autor vivo dentre os escolhidos pela UFMG", Vilela garante que não pretende "ficar curtindo os louros da vitória".
Para ele, a literatura brasileira vive um "bom momento, de plena efervescência". Implicitamente, sugere que nem tudo que está na praça é bom, quando afirma que é dessa grande quantidade que "nasce a qualidade". Instado a apontar alguns exemplos atuais de qualidade, menciona "contistas representativos" como o paulista Marçal Aquino e o paranaense Miguel Sanches Neto.
O próprio autor já prepara novo romance, que se chama "Perdição". A história --"que começou como conto, virou novela e agora é um romance"--fala de um pescador que recebe o convite de "uma dessas novas igrejas" para ir ao Rio de Janeiro, onde enfrenta uma crise existencial. Tendo como pano de fundo "a religião, o sexo e as drogas", o livro combate a comercialização da crença citando a segunda epístola de são Pedro: "E por avareza farão de vós negócio com palavras fingidas".
O ficcionista pretende concluir o livro em breve, para lançá-lo em 2004. Ainda não tem editora, pois está "em fase de negociação". Por seus cálculos, tem 23 obras publicadas, contando as antologias.
Seus textos foram traduzidos para várias línguas, como o inglês, o italiano e o alemão. Do talentoso aspirante às letras de 1967 ao escritor consagrado que hoje vive da pena em sua cidade natal de Ituiutaba (MG), realmente muita coisa mudou.
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