Eduardo Carvalho
"A verdadeira alegria é uma coisa séria." Sêneca
Uma cabeça
Estava esperando muito de A cabeça, do Luiz Vilela. Li Bóris e Dóris e gostei do ritmo, dos diálogos, das piadas. Gostei também do caráter um pouco patético dos personagens e do ambiente: um gerente conversando com sua mulher antes da convenção da empresa, numa cidade tipo Águas de Lindóia. É um livro engraçado nos detalhes mais superficiais – por causa da forma prática como o Bóris leva a vida – e espiritualmente triste, amargo. É um diálogo entre pessoas – um casal, aliás – que faz graça dos problemas que não consegue resolver. É de um cinismo simples, mas constante.
Mas não achei muita coisa nos dez contos de A cabeça. Os títulos são até bons, sugestivos: "Suzi", "A rua da amargura", "Freiras em férias", etc. Mas um, dois parágrafos em prosa, para Luiz Vilela, é muito. Não porque ele escreva mal. É que seus diálogos são perfeitos, e a gente não quer saber de introdução: a gente quer é ouvir a Suzi falando. Luiz Vilela escreve melhor quando não escreve, e em A cabeça ele escreve, digamos, um pouco demais.
E A cabeça tem um clima simbolista que me incomoda. Talvez seu texto comprimido precise de imagens fortes – uma cabeça no asfalto, etc. – para se expressar. Só que de novo: não me parece que seu talento seja o de trabalhar grandes idéias. Seus melhores personagens são pessoas sem idéias. Bóris, por exemplo, é um vácuo espiritual. Mas as suas frases são tão naturais, tão fluentes que às vezes ele parece um homem sensato. Como vários Bóris soltos por aí: cobertos por carne e recheados com vento.