PERDIÇÃO, DE LUIZ VILELA: UM
ÉPICO IRÔNICO E COMPASSIVO
Pauliane
Amaral
Graduada em Comunicação Social, mestranda em Estudos de
Linguagens na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
e integrante do Grupo de Pesquisa Luiz Vilela.
Email: paulianeamaral@gmail.com.
VILELA, Luiz. Perdição. Rio de
Janeiro: Record, 2011. 400 p.
Perdição, lançado em dezembro de
2011, é o mais recente romance do escritor mineiro Luiz Vilela, que dedicou
cerca de doze anos à escrita do livro. Com vinte e cinco livros publicados, entre contos, novelas, romances e antologias,
a trajetória do escritor, iniciada ainda aos 24 anos com o lançamento do livro
de contos Tremor de terra (1967), com o qual venceu o conceituado Prêmio
Nacional de Ficção, ganha mais uma obra prima.
Do seu lançamento até agora, Perdição gerou
repercussão entre críticos literários e
estudiosos, como o Professor Rauer Ribeiro Rodrigues, que estuda a obra de
Luiz Vilela há mais de dez anos. Rauer afirma que “o romance de Luiz
Vilela exala uma esperança desesperançada”. Jornais e revistas também
deram seu parecer sobre o livro, a exemplo da Revista Veja, que em nota
intitulada “Perdição”, no blogImperdível, afirma que “Luiz Vilela
desafia o conceito de epopeia ao colocar um pescador prosaico no centro de
um épico bíblico”.
Desde 1967, Vilela recebeu muitos
outros prêmios, foi adotado em vestibulares, traduzido em diversos países e
adaptado para teatro, cinema e TV. A crítica elogia,
na sua obra, a concisão, o coloquialismo, a maestria do diálogo e o vigor
da linguagem. A força de suas narrativas é alcançada sem pirotecnias ou
truques. A linguagem de sua obra é simples, mas temas complexos latejam
sob a superfície dos acontecimentos banais.
Começou a escrever aos treze anos,
depois de aprender a ler sozinho e sempre
estar, desde a primeira infância, com um livro na mão. Mudou-se aos
quinze anos de Ituiutaba, no Triângulo Mineiro, onde nasceu, para Belo
Horizonte. Formou-se em Filosofia, mas nunca buscou o diploma. Trabalhou por
quase um ano em São Paulo, como jornalista. Passou uma temporada nos
Estados Unidos e outra na Europa. Ao retornar ao Brasil, fundou uma
editora. Foi passar o Natal com a família e decidiu residir em Ituiutaba,
considerando o interior o melhor lugar para se dedicar integralmente à
literatura. Teve um filho e, depois, cuidou da mãe, que faleceu aos 106
anos, em 2011.
Declarou certa vez: “Eu só escrevo
quando a necessidade de escrever é tão natural
e tão imperiosa como a fome, a sede, o sono”. Já dissera, antes, que escrever
era consequência do que vivia, do que pensava, do que via e do que fazia.
Daí, concluiu: “a contribuição que um escritor pode dar à realidade de seu
país é contar tudo o que viu”.
Assim é Luiz Vilela, seu jeito de
ser, sua obra e o Perdição.
Desde a novela Bóris e
Dóris (2006), Vilela não publicava nenhum livro inédito. Perdição, com sua
inspiração bíblica, discute a mercantilização da fé em tempos em que tudo
virou comércio. Marcado pelo uso predominante do diálogo, um dos traços
característicos da ficção de Luiz Vilela, o livro narra a história
do pescador Leo, que, seduzido pelo líder religioso Mister Jones, se torna
pastor.
O romance é permeado por um tom de
ceticismo: o narrador Ramon, amigo de Leo,
tem postura cautelosa, para não dizer crítica, frente aos temas
religiosos, tão presentes em país no qual mais de 90% das pessoas
pertencem a alguma religião, conforme o Censo de 2000, época em que se
passa o enredo do romance.
Mas, no fim, Perdição trata
do homem, de sua ambição, sua ignorância, sua irracionalidade, suas taras, sua corrupção, seus sonhos, seus desalentos
– e de outras questões, comuns a todos nós.
O livro, dividido em três partes – “O
rapaz dos peixes”, “Pastor das almas” e
“Ninguém” –, prende o leitor no fluxo contínuo de acontecimentos que
traçam um panorama de nossa sociedade. No universo do romance, algumas
personagens partem em busca de redenção, transformando, muitas vezes, a fé
em subterfúgio para o comércio, enquanto outros, como o narrador Ramon,
criam um contraponto ao misticismo que o rodeia. Daí decorre que Perdição é um épico irônico e compassivo, cético, niilista, porém com uma ponta
de crença no humano.
Nesse mundo de inversão de valores, o
pescador Leo, incapaz de realizar milagre
que cure a própria filha, vê desvelada sua impotente condição
terrena, agora mais miserável que nunca. Para o crítico literário e
escritor Miguel Sanches Neto, “o romance é a história de uma busca”, uma
busca concluída com o fim trágico do pescador, o que nos remete às
limitações da existência humana e da inútil pretensão que temos em
transcender nossa própria natureza imperfeita.
Publicado originalmente na Revista Linha
d'água, do Programa de
Pós-Graduação em
Filologia e Língua Portuguesa da USP - Universidade de São Paulo. Confira em:
http://www.revistas.fflch.usp.br/index.php/linhadagua/article/view/464/445.
Filologia e Língua Portuguesa da USP - Universidade de São Paulo. Confira em:
http://www.revistas.fflch.usp.br/index.php/linhadagua/article/view/464/445.
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