sábado, 27 de julho de 2013

Trabalho sobre a "reinvenção dos sonhos perdidos" foi apresentado na ABRALIC 2013

No último dia 9 de julho, Eunice Prudenciano de Souza, doutora em Estudos Literários pela UNESP de Araraquara e integrante do GPLV, apresentou, no Simpósio da ABRALIC, o trabalho Em Luiz Vilela, a volta ao passado e à infância como reinvenção dos sonhos perdidos.

A comunicação se deu no Simpósio “Literatura e Dissonância”, mediado pelos Profs. Drs. André Dias e Rauer Ribeiro Rodrigues. O XIII Congresso Internacional da Associação Brasileira de Literatura Comparada aconteceu de 8 a 12 de julho em Campina Grande, PB. 

O simpósio tinha por proposta examinar a manifestação da dissonância nos discursos literários, permitindo o diálogo entre pesquisadores que se voltam para o estudo de autores e intelectuais que, de alguma maneira, divergiram ou divergem da ideologia dominante de seus respectivos momentos históricos e sociais. Nesse sentido, ao final de cada dia, foram feitos debates, intensos e produtivos, com os estudos ramificando-se em interfaces com a Filosofia, a História, a Linguística e outros ramos das Ciências Humanas.

Reproduzimos abaixo a Comunicação de Eunice e a ementa do Simpósio. A ementa está disponível aqui, e a lista de todas as comunicações aprovadas para o evento, está aqui.

Eis o resumo da Comunicação da Eunice:      

RESUMO: Nossa proposta é demonstrar de que maneira a narrativa de Luiz Vilela se torna dissonante em relação ao contexto no qual está inserida. Essa dissonância configura-se como resistência ao que oprime o indivíduo — inserindo-se, aí, as relações sociais encarceradoras, a barbárie do mundo capitalista de nossos dias e a solidão. Entre os contornos que esta resistência adquire, destacamos a volta ao passado e à infância como formas de resgate e valorização de sonhos que reinventam a vida. Partimos do conto “Lembrança” para explicitar o modo como o idoso está à margem da sociedade e como o tema aparece nas narrativas do ficcionista mineiro. Para demonstrar nossas proposições, destacamos “A volta do campeão”, conto em que o protagonista, um homem doente de quase sessenta anos, passa seus dias entediado e desinteressado de tudo, até encontrar um grupo de garotos jogando bilocas que o faz reviver a emoção dos tempos de menino. O colorido das bilocas figurativiza os ideais e desejos que, de algum modo, permaneciam nos recônditos da infância perdida. E, a despeito de Edmundo ter encontrado um novo sentido para sua vida, as pressões da família fazem com que a personagem desista dos novos amigos. De mesmo modo, no conto “O violino” é a figura de uma criança que possibilita o resgate de valores positivos, pois estas não foram ainda tolhidas pelos falsos conceitos cristalizados do mundo adulto. É um menino que, ao descobrir o velho violino no porão — espaço simbólico que abriga sonhos do passado —, possibilita o despertar de tia Lázara para antigas emoções. Novamente aqui, as pressões familiares serão as responsáveis pela conformação da personagem à desistência e à renúncia dos sonhos. Nos contos em questão, normas e comportamentos sociais situam a velhice à margem da vida e a voz do narrador, ao solidarizar-se com a profunda solidão a que são relegados, é dissonante diante do status quo.

Palavras-chave: opressão, resistência, sonhos.


Eis a ementa do Simpósio:  

LITERATURA E DISSONÂNCIA
Coordenadores: ANDRÉ DIAS, RAUER RIBEIRO RODRIGUES
A proposta do simpósio é examinar a manifestação da dissonância nos discursos literários, para discutir o modo pelo qual os mais variados autores se constituíram, através desses discursos, como vozes questionadoras de seus tempos e de suas sociedades. O tema está associado aos artistas e intelectuais que analisaram de maneira profunda e intensa aspectos primordiais das mais variadas épocas e construíram uma crítica aos valores presentes nessas realidades sociais. A ideia central é abrir espaço para o diálogo entre pesquisadores que concentram o olhar sobre autores e intelectuais que divergiram das ideologias dominantes, na poesia e na prosa, nos mais variados momentos históricos, nacionalidades ou segmentos sociais. O que se espera é que os trabalhos apresentados discutam, entre outras questões, o problema teórico do intelectual frente às variadas ideologias, quer sejam elas hegemônicas ou não, e o problema histórico dos escritores diante do status quo, manifestado no âmbito da política, da moral, dos costumes, da economia, etc. Nenhum discurso é proferido no vazio, já advertiu Mikhail Bakhtin (2003) em Estética da Criação Verbal. Não há razão para ser diferente com a literatura. Sendo assim, ao abordarmos a temática Literatura e Dissonância necessariamente levamos em conta o fato de que todo enunciado — unidade básica do conceito de linguagem em Bakhtin — exige a presença de um enunciador (quem fala, quem escreve) e de um receptor ou enunciatário (quem ouve, quem lê). Consideramos ainda que um enunciado é único e impossível de se repetir, pois exige uma realização histórica, acontece em um determinado local e em um tempo determinado, é produzido por um sujeito histórico e recebido por outro. Dessa forma, ao nos aproximarmos dos discursos literários temos sempre em vista tais premissas, que norteiam o desenvolvimento das nossas reflexões e ajudam a ampliar os sentidos das análises. O fórum, observada a premissa da dissonância no âmbito de estudos de literatura e do comparativismo, acata propostas que vão desde o enfoque do ensino da literatura à discussão teórica do embate entre o local e a dissolução das identidades, passando por descrições de obras e por interpretações de propostas estéticas. De modo que, seja no âmbito das territorialidades cujos limites se esvaem diante da instantaneidade das comunicações globais, seja no âmbito do regional esvaziado no mesmo diapasão em que os conceitos de literatura e de literariedade vigentes nos séculos XIX e XX perdem sentido com as realizações e as propostas estéticas dos autores do século XXI, procura-se o dissonante na antiga ordem hierarquizada, no recente e finado mundo bipolar ou no universo multilateral que se instaura. Há que se considerar, ainda, estudos comparativos entre autores que, mesmo distantes no tempo e no espaço, fixam a seu modo o questionamento de valores hegemônicos, constituindo uma família literária pelo liame da rebeldia e da inquietação.“Numa obra bem sucedida”, nos diz o ficcionista Cristovão Tezza (2012), estudioso do pensamento de Bakhtin (Tezza, 2003), “partilhamos a utopia de um mundo possível que, sem ocupar lugar real no espaço, será sempre uma chave generosa para que encontremos, narradores e leitores, nosso próprio espaço real.” Diante disso, vemos que há, pois, encontros vários, tanto os possíveis quanto os utópicos, construídos no espaço entre a estesia da representação literária e sua recepção, entre a proposição autoral idealizada, a atuação indiciada do narratário criado ficcionalmente e a resposta concreta obtida pelo leitor que divaga ou pela crítica, sendo a crítica e as leituras suplemento que se acumulam em palimpsestos infindos.Do ponto de vista da historiografia literária, qualquer que seja o modo analítico proposto, os problemas se sucedem, pois os últimos anos têm sido de deslocamento incessante dos postulados teóricos, cujos embates com o mundo concreto vem sendo cada vez mais inglórios, considerando a acelerada mutabilidade das circunstâncias sociais, políticas, históricas e das representações simbólicas, no âmbito das artes em geral e da literatura em particular.Levantar questionamentos, de preferência contundentes, e, eventualmente, produzir alguma conclusão, ainda que dissonante e provisória, é o que se espera alcançar.Referências BibliográficasBAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. Trad. Paulo Bezerra. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.BOSI, Alfredo. Literatura e resistência. São Paulo: Cia das Letras, 2002.DIAS, André. Lima Barreto e Dostoiévski: vozes dissonantes. Niterói, RJ: Editora da UFF, 2012.SARTRE, Jean-Paul. Que é literatura? Trad. Carlos Felipe Moisés. São Paulo: Ática, 1989.TEZZA, Cristovão. Entre a prosa e a poesia: Bakhtin e o formalismo russo. Rio de Janeiro: Rocco, 2003.TEZZA, Cristovão. O espírito da prosa: uma autobiografia literária. Rio de Janeiro; Record, 2012.TODOROV, Tzvetan. A literatura em perigo. Trad. Caio Meira. Rio de Janeiro: DIFEL, 2009.VARGAS LLOSA, Mário. A verdade das mentiras. Trad. Cordelia Magalhães São Paulo: ARX, 2004.

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