Ilustração: Theo Szczepanski
Prezado Gustavo,
A sua Fundação Cultural é uma piada. De mau gosto. Ou um circo cujos maltrapilhos palhaços não passam de porcos chafurdando no excremento municipal. Eu explico. É bastante simples. O senhor entenderá. Desde 2006, o Rascunho — um dos principais veículos culturais do país, com cerca de 40 mil leitores mensais nas versões impressa e digital — realiza em Curitiba o projeto Paiol Literário, no Teatro Paiol. Desculpa a redundância. O senhor conhece o projeto, pois já o vi algumas vezes na plateia. É um bate-papo com escritores. Em sete anos, participaram sessenta autores. Gente como João Ubaldo Ribeiro, Nélida Piñon, Ignácio de Loyola Brandão, Affonso Romano de Sant’Anna, Ana Maria Machado, Milton Hatoum, Moacyr Scliar e Cristovão Tezza.
A lista é longa. E importante. Todos os encontros foram devidamente registrados e reproduzidos nas páginas do Rascunho, em seu site e em programas da ÓTV, do Grupo Paranaense de Comunicação. Os bate-papos também serviram para capacitação de professores da rede municipal de ensino. Em breve, serão publicados em livro por uma grande editora. Portanto, o Paiol Literário é um consistente registro da literatura brasileira deste início de século 21. Mas ao que parece, sua acéfala equipe de cultura pouco se importa com a preservação da memória. Compreensível. Se não tem cérebro, não pode se importar com a memória.
Neste ano, o Paiol Literário deixará de acontecer no Teatro Paiol. E não contará com o apoio da sua incompetente, arrogante e aparvalhada Fundação Cultural. Veja, Gustavo, a literatura nunca foi importante aos governos. Nunca esteve entre as prioridades. Sei disso. Não sou ingênuo. Doar dentaduras e cadeiras de rodas é mais relevante. Entendo. Minha mãe usa dentadura. Mas eu as compro, que fique bem claro. E logo precisará de uma cadeira de rodas. Também a comprarei.
Esta carta não é motivada pela decisão da sua pândega Fundação Cultural de não patrocinar o Paiol Literário em 2013. O projeto acontecerá normalmente a partir do segundo semestre em outro espaço cultural. O Rascunho sobrevive há 13 anos (157 edições). O senhor sabe o que significa um jornal de literatura sobreviver 13 anos sem o amparo de leis de incentivo à cultura, pouquíssima publicidade, numa cidade periférica como Curitiba? E o que isso significa para a cidade? Pense nisso enquanto pedala pelas ruas de uma Curitiba de poucas ciclovias.
O motivo desta carta é a falta de respeito do superintendente da Fundação Cultural de Curitiba, senhor Igor Cordeiro, cujas características mais evidentes são a arrogância e uma estupidez atroz e risível. Um burocrata almofadinha que acredita ser Pinóquio uma criação de Walt Disney. Desde o primeiro contato, ele, Igor Cordeiro, nos garantiu que o Paiol Literário“é um projeto muito importante e que será mantido”. Após algumas conversas, e-mails, telefonemas, chega-nos uma desprezível esmola. Não somos porcos famélicos para receber a lavagem rala e insossa de uma Fundação Cultural cujos dirigentes não passam de quadrúpedes pestilentos.
Reproduzo a seguir o e-mail enviado na quinta-feira (16) pela senhora Mirele Camargo, coordenadora de Relações Institucionais e Marketing da sua indecente Fundação Cultural. As esmolas oferecidas:
1) “Sugestão para nossa contrapartida é que seja a mesma do ano passado (quando não houve aporte de recurso), com cessão do espaço e dos funcionários. Complementaríamos com apoio de mídia (guia cultural e divulgação) e com divulgação”.
A senhora Mirele é uma coordenadora mal informada. Em 2012, houve “aporte de recurso”. Desde 2006, há “aporte de recurso” da Fundação Cultural, Sesi Paraná e Rascunho para a realização do Paiol Literário.
Oferecer apoio de mídia é, no mínimo, ridículo. Divulgação? Não nos faça rir. Até mesmo o porteiro da garagem do prédio do Rascunho sabe mais de comunicação do que toda a equipe da sua Fundação Cultural.
2) “Outro apoio possível: três passagens aéreas ida e volta com estadias.”
Pretendemos convidar oito escritores para a edição deste ano do Paiol Literário. Sendo assim, alguns terão de vir a pé a Curitiba. Imagino que Francisco Dantas, do Sergipe, leve alguns meses até chegar aqui. Levando em conta a proposta mesquinha e estúpida da sua Fundação Cultural, alguns autores poderiam dormir na casa da senhora Mirele Camargo ou do senhor Igor Cordeiro. Talvez seja esta a intenção. Desconheço os fetiches sexuais de ambos. É possível que um escritor de cuecas na cozinha seja um deles. Nunca se sabe.
Desde 2006, o Paiol Literário acontece com “aporte de recurso”, como gosta de definir a senhora Mirele, do Rascunho, Sesi Paraná e Fundação Cultural. Mas “aporte de recurso” é bem diferente desta esmola molambenta oferecida na gestão que se inicia. Que início!
Reitero: esta carta é motivada pela falta de respeito, amadorismo e incompetência de sua estropiada equipe de cultura, tão mal representada pelo senhor Igor Cordeiro. Mas não se preocupe, Gustavo, o senhor poderá acompanhar o Paiol Literário 2013 confortavelmente acomodado na plateia. Logo, teremos o novo local e a programação completa. Faremos com “aporte de recurso” próprio (ou seja, meu) e do Sesi Paraná, que está conosco desde 2006. Não desistiremos. Eu nunca desisto. Nunca.
Em tempo: já que a sua equipe não entende nada de literatura, por favor, termine logo as obras na rua em frente ao Rascunho (Rua Carlos de Carvalho, 655). Se não sabem o que é um livro, um escritor, que saibam pelo menos tapar um buraco, construir uma calçada.
Fique bem. E boa sorte. O senhor vai precisar.
Um abraço.
Rogério Pereira.
P.S. Agradeço aos funcionários do Teatro Paiol (Lilian, Rogério, Aladim e companhia), que nos trataram com carinho, respeito e profissionalismo de 2006 a 2012. E o apoio recebido de Beto Lanza, Mariane Filipak Torres e Mauro Tietz, funcionários da Fundação Cultural de Curitiba, que sempre acreditaram na importância do Paiol Literário.





Da poesia étnica ao épico bíblico

Curitiba Literária destaca poeta da geração beat e o mineiro Luiz Vilela
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Já o mineiro Luiz Vilela participa do evento promovido pelo jornal Rascunho e vem a Curitiba derrubar o mito de que é recluso. Autor de Bóris e Dóris (Record), ele conta que já terminou o seu aguardado romance “épico de inspiração bíblica” Perdição, sobre um jovem pescador abordado por dois pastores de uma nova religião que o convencem a virar um pregador. O jovem viaja para a capital e acaba fazendo dinheiro com a fé alheia, e volta a sua cidade natal para experimentar a decadência moral e física.
“É um negócio do tipo ‘ascensão e queda’”, explica Vilela. A expectativa em torno do romance, que deve sair no ano que vem, se deve em parte pelo perfeccionismo do autor. “O texto está concluído e agora é o trabalho de lapidação”, diz, admitindo que esse momento é crucial porque se sente capaz de reescrever um texto inúmeras vezes, sem nunca considerá-lo pronto.
O livro faz referência ao episódio bíblico de Pedro, o pescador transformado em apóstolo por Jesus Cristo. Vilela conta que o livro fará jus à fama de suas histórias que sempre acabam de modo trágico. E diz que a citação à Bíblia nada tem a ver com afetações “pós-modernosas” (“Acho isso uma chatura”) e funciona mais como um ponto de partida para o enredo.
Desnecessária
“Essa pergunta é terrível e eu não tenho a resposta”, diz Vilela ao ser questionado sobre para que serve a literatura, idéia que costuma abrir todas as edições do Paiol Literário. “Penso que a resposta é desnecessária e que nunca me fez falta.”
Vilela tem 64 anos, é um entusiasta dos eventos literários e acha que qualquer iniciativa que procura divulgar a literatura “se justifica”. Porém, defende que “nada substitui o contato do leitor com os livros”. Embora goste do retorno dado pelos leitores, não é nem um pouco ansioso por tecnologias que tornem essa relação mais fácil ou freqüente demais. “Terceirizei tudo”, brinca. Não usa celular (“É uma coleira”), não tem computador nem e-mail. Escreve seus livros somente à mão e, depois de terminar a primeira versão, entrega para alguém digitá-la. Dessa forma, acredita que consegue ter os benefícios da tecnologia sem aturar a dor de cabeça que a acompanha.